* Pesquisa realizada como aluna do Programa de Pós-graduação em Psicologia da Universidade Federal da Bahia, com financiamento da CAPES, pelo Programa de Doutorado Sanduíche no Exterior, e da Fapesb, pelo Programa de Bolsa de Doutorado.

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sábado, 27 de fevereiro de 2016

SURDEZ E PRÁTICA DE ESPORTES

As Olimpíadas e Paralimpíadas do Rio estão chegando! Logo, logo o país receberá os melhores atletas do mundo de diversas modalidades. Mas, não precisa ser atleta, nem ouvinte, pra praticar esportes! De um modo geral, não há nenhuma restrição à prática de atividade física que se deva diretamente à surdez, mas algumas adaptações e cuidados podem ser necessários. 

No caso dos esportes coletivos, é preciso encontrar uma forma de comunicação que permita a compreensão por todos os participantes. Do mesmo modo, nos esportes como corrida e natação, em que as largadas são sinalizadas por avisos sonoros, é preciso adaptar, substituindo-os, por exemplo, por sinais luminosos. Nos esportes de risco e esportes radicais, em que as instruções de alerta e segurança sejam passadas pela via sonora, também será necessário encontrar formas alternativas de fazê-lo. 

Nos esportes aquáticos, para aqueles que usam aparelho auditivo ou implante coclear, a regra geral é retirar o aparelho, ou componente externo do implante, durante a prática. Porém, alguns dispositivos já permitem o uso na água, enquanto outros contam com equipamentos de proteção que impedem que o aparelho entre em contato com a umidade e se danifique. Nesse caso, vale à pena conferir as recomendações e possibilidades de cada dispositivo.

Para os usuários de implante coclear, são necessários cuidados especiais para a prática de alguns esportes, especialmente aqueles que aumentam as chances de fortes pancadas na cabeça, as quais podem, a depender da localização e intensidade, danificar o componente interno. Então, se esse for o seu desejo, será preciso se orientar direitinho com a equipe do serviço em que você foi implantado*.

Algumas síndromes e condições que estão associadas à perda auditiva, como a Doença de Ménière por exemplo, também podem causar problemas de equilíbrio. Embora a atividade física seja recomendada na maior parte dos casos, é preciso escolher uma modalidade que não exponha o praticante ao risco de quedas e que não potencialize as dificuldades de equilíbrio. 

Finalmente, seja você surdo ou ouvinte, sempre que vamos começar a praticar uma atividade física, é preciso consultar um médico e checar suas condições de saúde. Além disso, é preciso respeitar os limites do nosso corpo, começando com uma intensidade moderada, que poderá ser aumentada a medida em que vamos adquirindo condicionamento físico. Se a prática for ao ar livre, lembre-se de se proteger do sol, com roupas adequadas e uso de protetor solar. Lembre-se também de beber muita água e de se alimentar bem.   

Se você ainda se sente inseguro, procure se comunicar com outros surdos que praticam esportes e saber como eles resolveram os possíveis desafios de cada modalidade. Você também pode entrar em contato com as diversas associações e grupos de esportistas surdos.  Agora é só escolher a modalidade que mais lhe agrada, certificar-se de que adotou as medidas necessárias para que o esporte escolhido seja praticado de forma segura e de que seja prazeroso. Faz bem pro corpo e pra mente. 

Imagens retiradas da internet
* Para mais informações sobre a prática de esportes por implantados, vejam esses dois posts de Lak Lobato:
Praticando esporte com o Implante Coclear
Usando (ou não) o implante coclear na praia ou na piscina





terça-feira, 27 de outubro de 2015

SURDEZ E CUIDADOS COM A SAÚDE

Ainda que a surdez possa estar associada a outras condições médicas, como em algumas síndromes, ou infecções virais, por exemplo, ela não traz com ela nenhuma doença, fragilidade ou problema de saúde, de qualquer natureza. No entanto, você sabia que crianças e adultos surdos, especialmente surdos pré-linguais, podem estar mais expostos a acidentes e problemas de saúde, por conta dos entraves da comunicação? 

Hauser e colaboradores, em artigo escrito em 2010, relatam estudos que mostram que as crianças surdas estão mais expostas a acidentes e machucados. Segundo os autores, isso deve estar associado ao fato de os filhos geralmente serem alertados pelos pais sobre perigos e ensinados sobre como e de que se proteger de modo oral. A informação sobre lugares e situações perigosas circula entre as crianças e pessoas próximas eminentemente de modo oral, seja diretamente, seja ouvindo conversas de terceiros.

Direito sobre imagem: Jeitos de Ser e Conviver


Surdos também apresentaram dificuldade em se familiarizar com a história médica da família, conhecimento importante para os cuidados com a própria saúde. Saber daquela tia que teve câncer de mama, ou do avô que faleceu de problema cardíaco, ou daquela prima que tem diabetes, todas essas são informações que nos ajudam a conhecer nossas heranças genéticas e a nos prevenir. Acontece que essas histórias são comentadas, em geral, informalmente, em conversas familiares. 

Os autores citam também vários estudos que demonstram um elevado desconhecimento das pessoas surdas com relação a sintomas de doenças e cuidados com a saúde, quando comparados com adultos ouvintes. Eles supõem que grande parte deste conhecimento é adquirida de modo incidental e informal, nas conversas cotidianas. Cabe lembrar que cerca de 95% das crianças surdas nasce em famílias de ouvintes, muitas delas com pouco ou nenhum contato prévio com surdos. Estas famílias costumam organizar suas trocas cotidianas essencialmente de modo oral.

Direito sobre imagem: Jeitos de Ser e Conviver


Isso significa que toda uma série de conceitos, comportamentos, posturas, cuidados, que são transmitidos entre as pessoas de modo espontâneo, ou pelo que chamamos de aprendizagem incidental, precisa ser ensinada aos surdos de forma sistemática. Essa é uma compreensão difícil para os pais, já que a maioria deles viveu uma experiência amplamente sustentada nas trocas orais. No entanto, é importante que a família se ocupe disso de forma consciente. E se você é surdo, fique atento, pergunte, procure informações e se intere sobre a história médica da sua família. 

Do mesmo modo, os profissionais de saúde devem garantir que toda informação e orientação seja compreendida integralmente pelo surdo nas situações de atendimentos clínicos, de realização de exames e de prescrição de remédios e tratamentos. É importante ainda que a acessibilidade às informações e serviços médicos pelo surdo seja objeto de políticas específicas de saúde, com campanhas que contemplem todas as diferenças linguísticas.

Referência: 
HAUSER, P.C.; O´HEARN, A.; MCKEE, M.; STEIDER, A.; THEW, D. Deaf epistemology: deafhood and deafness. American Annals of the Deaf, v. 154, n. 5, 2010.

quinta-feira, 9 de julho de 2015

SEREMOS TODOS SURDOS?

Não, não acho que um dia seremos todos surdos, porém, com o aumento da expectativa de vida e de outros fatores de risco, tais como exposição ao barulho e a substâncias ototóxicas, todos nós estamos mais sujeitos a ter uma perda auditiva progressiva. A perda auditiva relacionada ao envelhecimento é chamada presbiacusia.  Além de fatores ligados ao estilo de vida, como tabagismo, uso de medicações e consumo de álcool, os fatores genéticos também são muito importantes.

Diferente de uma perda súbita, ou de uma perda congênita, ou seja, quando a pessoa já nasce surda, a perda progressiva é mais dificilmente percebida. Sem se dar conta, a pessoa vai desenvolvendo alguns mecanismos compensatórios, como a leitura orofacial, por exemplo. Mesmo assim, é comum que a pessoa comece a ter dificuldades em acompanhar uma conversa entre várias pessoas ou em um ambiente com mais ruído e que as situações de comunicação se tornem muito fatigantes, pelo nível de concentração exigido. Isso pode resultar em um maior isolamento, com a recusa em participar de situações sociais e uma maior impaciência. Muitas vezes, a família ou as pessoas próximas entendem isso como um sentimento de depressão ou como “coisa da idade” e o diagnóstico demora pra ser feito ou nem chega a ser feito. Outras vezes, a pessoa esconde sua dificuldade em ouvir, tornando a adaptação de todos ainda mais difícil.

Nos casos de presbiacusia, o uso de aparelhos auditivos pode ajudar, no entanto, muitas vezes não se tem o cuidado necessário com a adaptação das próteses. Esse é um processo delicado e contínuo, que deve acompanhar as variações na perda e as demandas e estilo de vida de cada usuário. O descuido com a adaptação, por desinformação ou por dificuldade em dar continuidade ao acompanhamento, faz com que muita gente desista do uso dos aparelhos por não perceber um ganho concreto.

No entanto, tão ou mais importante do que o uso dos aparelhos é a atitude da pessoa com a perda e das pessoas próximas. Algumas coisas simples podem facilitar a comunicação, tais como: chamar atenção da pessoa, de preferência com um toque ou gesto, quando for se dirigir a ela; procurar falar de forma mais clara e lenta, olhando diretamente pra pessoa e sem gritar; certificar-se de que a pessoas entendeu; quando possível, utilizar meios visuais para reforçar mensagens importantes; privilegiar situações e locais com menos barulho pra facilitar a interação, e; principalmente, não desistir de se comunicar.

Embora exista uma grande diferença entre a presbiacusia e a surdez, todas essas orientações também são válidas quando estamos conversando com um surdo que faz leitura orofacial. Pensando bem, por que esperar que nós ou alguém próximo tenha uma perda auditiva pra desenvolvermos uma postura que facilite o contato entre surdos e ouvintes? Mais uma vez fica claro que, quando temos uma atitude inclusiva, somos todos nós que saímos ganhando. 

Foto de arquivo pessoal